Vamos à Parada? Não, muito obrigado! – por Enézio de Deus

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Foto: Divulgação | APOGLBT

Nunca me senti representado pelas chamadas “Paradas LGBTTT” (ou qualquer outro nome que já tiveram ou lhe sejam dadas) no Brasil. Ao contrário de um caráter cívico-político ou de ativismo realmente organizado para exigir respeito aos direitos (“nada menos; nada mais”), a exemplo de muitas que ocorrem em outros países, a forma “carnavalesca”, desnecessariamente exagerada como elas são estruturadas e têm se apresentado nos diversos rincões do nosso país somente me envergonham. Na época das edições do meu primeiro livro jurídico e quando membro da Comissão da Diversidade da OAB/BA (até quando pensei que essa também me representava; felizmente, pedi para sair), compareci, rapidamente, ou acompanhei, sobre trios, partes de pontuais edições de paradas em Salvador e em Feira de Santana, tendo-se em vista homenagem que nos prestaram pela nossa defesa do direito de adoção por casais homossexuais realmente estáveis e da pretérita atuação da incipiente composição da referida comissão da OAB. 

Salvo motivo institucional ou de grande relevância diversa, nem eu nem meu companheiro comparecemos (felizmente, ele já comungava da mesma posição antes de nos relacionarmos), porque, apesar da importância de tais oportunidades de visibilidade e de militância sólida, as/os LGBTTTs sensatas/os não negam que a maioria se mobiliza mesmo para a “festa” (para a dança, a “aparição”, os flertes, paqueras, para o sexo – quanto mais ilimitado, melhor/melhor mesmo? -, para os flashes, etc) e, por ela, pela festa, para conhecerem “pessoas novas”, para viajarem país afora, movem “céus e terra” – alguns/mas que conheço, mesmo sem poderem financeiramente; mas se “endividam ou dividem” nos cartões, se for o caso. 

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AFP PHOTO | Miguel Schincariol

Os eventos que se propõem sérios, que quase sempre precedem ou integram as paradas, como seminários acadêmicos, atos políticos públicos, dentre outros, não tem mais que ínfima parte dos/as milhões (muitas/os aparentemente “ensandecidos/as”) percorrendo, com seu baixíssimo senso crítico ou de conhecimento sobre sua própria realidade (com exceções, é lógico, porque há gente sensata/séria que ainda vai, expondo-se), as ruas, ao som de trios elétricos. Encontros para debates centrados/fundamentados/científicos em torno dos direitos? Estão bem ou incomparavelmente vazios. Discussões sérias nas redes? Poucos/as delas participam, por desconhecimento mesmo da realidade que as/os circunda em termos de ranços e avanços político-científico-institucionais na tão interessante e complexa seara LGBTTT. 

Os vistos como conservadores e homofóbicos continuarão falando e bradando – em alguns pontos – com certa razão? Lógico! Não é querendo que a sociedade “engula” imagens ridículas a todo custo, que essa o fará ou respeitará/admirará as diversidades sexuais e de (trans)generidade humanas. Apesar da procedência/relevância da nossa luta pública em prol de tal respeito às diversidades (luta da qual não desistiremos nem abriremos mão – haja vista as nossas palestras, participações na mídia, pesquisas, livros e outras publicações), justamente como pessoa centrada e como pesquisador não “afetado” pelos desvarios de alguns/mas militantes, prosseguiremos esclarecendo – a tantos/as quantos/as for necessário – que estes eventos, no geral, NÃO me representam (à exceção de atividades realmente científicas, políticas e/ou outras sérias que os precedam), assim como, tenho certeza – porque ouço de incontáveis outras/os LGBTTTs o mesmo – não representam outro grande sem número de homossexuais e transgêneras/os. 

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Foto: Reuters/Joao Castellano

Nenhuma posição é absoluta, porque o bom senso comporta/identifica sempre contrapontos e exceções. Mas, no geral, é isto. Por exemplo: será que alguma lésbica ou gay cristã/ão, em mínima “sã consciência” e harmonizada/o com a sua livre fé, sentiu-se bem ao ver representações absurdas, de baixíssimo nível, relacionadas ao nosso Amado Mestre Jesus? Lógico que não. Sentiram-se ofendidos num evento que diz estimular o “respeito à diversidade”. Será mesmo que as paradas têm conseguido tal respeito ou têm gerado mais efeitos contrários? Para que elas têm servido mesmo, afinal? Se se cogitasse uma representação religiosa deturpada e ofensiva à base/fé de matriz africana, ao Candomblé mais especificamente, que desconfigurasse o que tal matriz ensina, duvido que tal fosse inserido nas paradas, porque também virou, de há muito, uma espécie de “tendência ou moda”, no meio LGBTTT, dizer-se do Candomblé, da Umbanda ou ser “sincrético” (porque, afinal, a “diva” artista – cantora em especial tal e qual – o é assumidamente há anos, canta sua fé tão bela, assume, fala e, então, também seremos ou nos daremos a oportunidade de também sermos ou dizermos que somos/admiramos o Candomblé!). 

De outro lado, por conta de haver certo número de cristãos radicais ou fundamentalistas (que também jamais nos representam; a maioria evangélica), assumir-se, harmoniosamente, lésbica, gay ou travesti e cristã/cristão, atualmente, passou a ser alvo de preconceitos vindos de tantos/as próprios/as outros/as gays, lésbicas e transgêneras/os ou militantes. Se o discurso é em prol do respeito à diversidade, por que não testemunhá-lo realmente? 

Concluo pelo incontestável: na histórica/complexa rede de absurdos desrespeitos a LGBTTTs, infelizmente, muitas/os deles/as – pelo que temos comprovado -, são bem menos vítimas e mais (lamentável!) colaboradoras ou provocadores daquilo que “dizem/dançam” combater. 

Costumo repetir, aos/às mais próximos/as, que um gay (trazendo para o “meu espelho”) pode ter os bens materiais mais “invejados”; honoríficos ou acadêmicos títulos admiráveis do mundo: mas, assim como qualquer outra/o cidadão/ã, se não entender o seu papel e postura no mundo do respeito que tanto exige, dando o primeiro exemplo, JAMAIS será respeitado. Se o for, se-lo-á mais por hipocrisia/interesses outros alheios, do que, de fato, pela sua missão no mundo. Quem tem senso crítico/transformador/educacional da realidade e é um pesquisador, por exemplo, não pode desconsiderar tais aspectos igualmente visíveis, embora lamentáveis, na necessária marcha da luta humana contra o preconceito. 

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Foto: Divulgação

Não me orgulho da minha orientação sexual, nem o faria se fosse/estivesse no rótulo “hétero”: ela é um fato tão medíocre (no sentido de trivial da vida), como eu me manter ou não com barba, por exemplo. Jamais me envergonhei de tudo que me compõe, mas cada parte é, igualmente, uma dentre tantas outras. Estar harmonizado e livre com os próprios desejos e com as escolhas na forma de experienciá-los é bom? Sim, é maravilhoso! – tão maravilhoso quanto eu escrever este ensaio (como diz um militante: “nem menos, nem mais” rsss). 

Algo, porém, orgulha-me, sinceramente, no melhor sentido: ainda enfrentando alguns reveses, eu me manter honesto/íntegro num mar de tantas corrupções/”jeitinhos”, de todos os tamanhos, que nos cercam lado a lado. Orgulha-me, também, a minha livre/serena opção pela proposta ética de Jesus e ser, também assumidamente, um cristão neste mundo de calamidades. Tais posturas/traços são nobilíssimas/os para mim, porque só almas fortes combatem, com ternura, humanismo, dignidade e respeito, estes difíceis “bons combates”. Muitas outras almas, que se dizem “defensoras disto, daquilo ou combatentes”, estão bem mais combalidas, em verdade, ou, no mínimo, sobremaneira desarmonizadas – ávidas por câmeras e flashes, por exemplo, para, “em nome da defesa”, sentirem-se “importantes”, bajuladas ou úteis no “mundo midiático” ao qual amam com especial ardor; com muito mais problemas do que maior parte de vocês, leitores/as, às/os quais agradeço a oportunidade das reflexões, aqui por mim/por nós tomadas com a maior seriedade. 

10372776_10152481106247296_3824661945979343340_nEnézio de Deus – Doutorando e Mestre em Família pela Universidade Católica do Salvador; Advogado e servidor público efetivo do Estado da Bahia.

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